Tempo, Aspecto e Modo
O tempo, aspecto e modo são 3 características dos verbos, os três são coisas diferentes mas muito geralmente se juntam em conjugações de verbos.
Basicamente o tempo indica quando um verbo acontece. O aspecto indica como um verbo acontece. E o modo indica o sentimento do falante sobre o que é falado.
As próximas partes vão dar uma explicação mais profunda de todos eles.
Tempo
Na linha do tempo abaixo tem os 3 tempos básicos: passado, presente e futuro.
Em português o tempo é indicado por sufixos ligados ao verbo, outras línguas podem fazer o mesmo usando partículas que mudam o verbo (língua ficcional para exemplo)
Mesmo que o verbo imae seja o mesmo as partículas da e su indicam o tempo. Diferentemente há línguas que não tem nenhuma marcação de tempo, como Mandarim, Malaio, Vietnamita, Guaraní etc.
Essas línguas usam perífrase para denotar o tempo, isso significa usar advérbios, verbos auxiliares, ou distinções de aspecto e modo para dar o mesmo significado que o tempo.
我
wǒ
eu
爱
aì
amar
他
tā
ele
"Eu amo ele" ou "Eu amei ele" etc.
Algumas línguas tem 2 distinções, como passado e não-passado (Inglês, Japonês, Árabe etc.), ou futuro e não-futuro (Groelandês, Quechua e outros difíceis de achar exemplos):
Em inglês will é um auxiliar usado para indicar o futuro, mas o presente pode ser usado como futuro em inglês quando houver contexto. Em japonês 歩くaruku não tem uma forma perifrástica do futuro como em inglês e depende somente do contexto para isso.
Outros tempos absolutos
Além dos tempos básicos passado, presente e futuro, algumas línguas podem fazer mais divisões, como passado remoto, ou futuro remoto. A língua australiana Kalaw Lagaw Ya tem 6 tempos morfológicos, 3 para o passado e outros 3 para o não-passado:
Algumas linguagens também tem divisões específica pro dia de hoje, chamados de tempos hodiernos, esse conceito também pode ser usado para uma divisão de ontem e amanhã (não encontrei uma língua usando isso):
Tempos relativos
Todos os tempos mostrados até agora são absolutos, isso significa que eles tem como referência o tempo presente. Mas também há tempos relativos, que falam de um tempo comparado a outro tempo.
Em português temos 2 tempos relativos, o Pretérito Mais-que-perfeito e Futuro do Pretérito.
O Pretérito Mais-que-perfeito se refere a um evento no passado em relação a outro evento no passado, por exemplo em "Eu já assistira o filme quando ele me chamou", assistira se refere a um evento mais no passado do que chamou, que aconteceu no passado do momento da fala:
O Futuro do Pretérito se refere a um evento no futuro em relação a outro no passado, por exemplo em "Eu saí e só retornaria 2 horas depois", o retorno acontece no futuro, depois da saída:
Aspecto
Aspecto está relacionado com a duração e desenvolvimento do verbo, ele costuma estar muito ligado ao tempo, por isso a linha do tempo ainda vai ser útil.
Perfectivo e Imperfectivo
A distinção de aspecto mais comum em todas as línguas é o perfectivo e o imperfectivo. O perfectivo trata de eventos completos e num ponto definido, enquanto o imperfectivo trata de eventos que estão acontecendo, se repetem ou são habituais.
Na linha do tempo um verbo no perfectivo pode ser representado com um ponto, e o imperfectivo por uma área.
"Eu escrevi cartas hoje de manhã"
"Eu escrevia cartas hoje de manhã"
O imperfectivo pode ser usado em relação a outro tempo, como em "Eu escrevia cartas hoje de manhã, quando meu pai chegou", isso indica que a escrita acontecia prestes a chegada do pai.
Em português as conjugações Pretérito Perfeito e Imperfeito estão ligados ao tempo passado, o verbo escrevi está no passado perfectivo e escrevia no passado imperfectivo. Outros tempos podem ser colocados no imperfectivo com o verbo estar, em inglês o mesmo é feito pelo verbo to be por exemplo:
- estou escrevendo, I am writing
- estava escrevendo, I was writing
- estarei escrevendo, I will be writing
Esse imperfectivo pode ser considerado uma especialização chamada aspecto progressivo ou contínuo, já que indica uma ação acontecendo no momento.
Em algumas línguas o perfectivo é relacionado com o passado, já que indica ações completas e o imperfectivo é relacionado com o não-passado. Em Mandarim aspectos podem ser usados para indicar tempo dessa forma.
我
wǒ
eu
爱
aì
amar
了
lè
PFV
他
tā
ele
"Eu amei ele"
我
wǒ
eu
在
zaì
PROG
爱
aì
amar
他
tā
ele
"Eu estou amando ele"
Aspecto Perfeito
Culpando os gramáticos latinos e os europeus que continuaram as escolhas deles, o aspecto perfeito é diferente do perfectivo. O perfeito é uma junção de tempo e aspecto, e se refere a algo que aconteceu no passado e ainda tem relevância no presente.
"Tenho escrito cartas esse mês"
Nesse caso a ação foi feita repetidamente até o presente, outras línguas tem casos adicionais:
Jake
Jake
has
PRF
been
estar.PTCP
in
em
Brazil
Brasil
"Jake já esteve no Brasil"
Nesse caso a ação aconteceu só uma vez, mas é relevante para a situação atual.
Outro nome proposto para evitar confusão com o perfectivo é retrospectivo RET, acho que deviam usar mais.
Outros aspectos
Essa é uma lista de alguns aspectos encontrados por aí, tem muito mais que esses, alguns deles nem parecem aspectos
Habitual, Contínuo, Progressivo, Estativo
Esses 4 são subtipos de imperfectivo, línguas podem escolher separar partes diferentes:
- Imperfectivo: quando o verbo não acontece num momento definido.
- Habitual: quando o verbo acontece repetidamente em várias instâncias — "Eu faço caminhada todo dia"
- Contínuo: quando o verbo está em andamento — "Estou fazendo caminhada"
- Progressivo: quando o verbo está em andamento e em evolução — "Estou comendo"
- Estativo: quando o verbo está em andamento mas não muda de estado — "Eu sei nadar"
Discontínuo
O aspecto discontínuo indica algo que aconteceu no passado e não é relevante no presente. Dessa forma é o contrário do perfeito.
Prospectivo
O aspecto prospectivo é a versão futura do perfeito (retrospectivo). Ele indica algo que vai acontecer devido a algo no presente.
Incoativo e Terminativo
O aspecto incoativo indica algo que acabou de começar e o terminativo algo que acabou de terminar.
Genérico e Episódico
Esses dois aspectos contrastam um com o outro. O genérico trata de coisas gerais consideradas verdades, e o episódico trata de coisas que aconteceram em algum momento, que é o caso de todos os outros aspectos já mostrados.
Iterativo e Frequentativo
Esses dois indicam um evento que se repete, o iterativo são ações completas que se repetem da mesma forma. O frequentativo é para ações que se repetem desordenadamente, variando em tempo ou em espaço.
Modo
O modo mostra como um verbo está relacionado com a verdade ou a realidade.
Indicativo (Realis)
Todas as línguas tem um modo realis, que é aquele usado para falar fatos, todas tem o modo indicativo, mas algumas tem modos realis adicionais.
Outros tipos de realis são Evidencialidade, que informam a natureza de uma informação; e Admirativos que informam a surpresa ou preparo sobre a informação. Evidencialidade é um assunto complexo que merece um artigo próprio.
Em algumas línguas semíticas existe um modo energético que indica algo muito acreditado pelo falante.
Alguns linguistas consideram que exista um modo interrogativo usado para fazer perguntas.
Irrealis
O modo irrealis é usado para coisas que não se tem certeza, são assumidas ou como deviam ser.
Subjuntivo (Epistêmico)
Os modos que falam sobre possibilidade ou chance são epistêmicos. O modo mais comum desse tipo é o subjuntivo que serve pra qualquer coisa. Em português existe um subjuntivo pros 3 tempos básicos:
- Subjuntivo presente: Quero que ele ande logo
- Subjuntivo passado: Se o carro funcionasse já estaríamos lá
- Subjuntivo futuro: Só vou pra lá quando os porcos voarem
O subjuntivo geralmente é usado numa frase subordinada, isso está mostrado nos exemplos pela palavra em itálico
Outras formas epistêmicas são:
- Especulativo: Não há certeza sobre a veracidade da informação — "O mordomo talvez seja o assassino"
- Dedutivo: A informação é baseada em fatos conhecidos mas não é comprovada — "Ele deve estar em casa já que a luz está acesa"
- Presumido: A informação é baseada no fato que isso geralmente é verdade — "O balde vai acabar congelado se ficar no gelo lá fora"
Imperativo (Deôntico)
Os modos que falam como as coisas deviam ser como indicar ordens ou esperanças são deônticos. O modo mais comum desse tipo é o imperativo usado para dar ordens ou pedidos: "Vá à padaria para mim."
Outras formas deônticas são:
- Permissivo: Usada para dar permissões — "Você pode ir pra rua agora"
- Obrigatório: Usado para ordens, equivalente ao imperativo se não houver outros modos — "Acenda o farol a noite"
- Proibitivo: Uma forma negativa do obrigatório — "Não ultrapasse!"
- Volitivo: Usado para desejos — "Tomara que não chova amanhã"
- Proposicional: Usado para conselhos — "Você devia tomar um chá"
- Dinâmico: Usado para expressar habilidades ou capacidades — "Eu posso subir essa montanha!"
Condicional e Propositivo
O modo condicional expressa uma proposição que depende de uma condição. Em português o Futuro do Pretérito também tem função de condicional: "Eu andaria a pé se não tivesse tão cansada".
O propositivo é usado para indicar propósito: "Eu emprestei um dinheiro pra que ela pudesse entrar no ônibus".
Quotativo
Talvez não seja exatamente um modo e sim um tipo de evidencial, mas é uma forma de dizer que algo foi falado por outra pessoa: "Paula me disse que você é um ótimo cantor."
Formas Não-Finitas
Verbos que são associados a um sujeito são verbos finitos, os que não tem sujeito são não-finitos.
Um deles é o infinitivo que é a forma não-finita geral. Muitas línguas não tem um infinitivo e usam verbos normais no lugar. Exemplos:
- Tom prometeu que ia fazer o trabalho.
- Alguém se recusou a ajudar.
O particípio é uma forma verbal que tem características de um adjetivo. Algumas formas chamadas de gerúndio são na verdade particípios, como em português.
- O painel caído atrapalhou o corredor. (Particípio Passado)
- As crianças estavam brincando felizes. (Particípio Presente, chamado de Gerúndio)
Outras vezes o gerúndio se refere a um verbo que funciona como um substantivo, mas isso pode ser considerado um infinitivo:
- Jogar bola é legal.
As formas não-finitas podem ser flexionadas por tempo aspecto e modo assim como as formas finitas, mas em algumas línguas elas não são.
Outra forma não-finita interessante são converbos, mas eles merecem um artigo próprio. Basicamente são formas de um verbo que agem como um advérbio.
Conclusão
Espero que essa chuva bem longa de informações ajude a escolher um sistema de verbos pra sua língua.
Aqui eu vou fazer um exemplo na hora para demonstração:
Conjugações de imae "Andar"
- Infinitivo: imae
- Particípio: imae e
Na tabela abaixo + significa que qualquer forma conjugada pode seguir.
Habitual | imae | ele anda |
---|---|---|
Perfectivo | da imae | ele andou |
Imperfectivo | u imae | ele andava/está andando |
Futuro | su imae | ele andará |
Sugestivo | u imae e | ele vai estar andando/é capaz de andar |
Prog. Pass. | da imae e | ele estava andando |
Perfeito. | da u imae | ele tem andado |
Volitivo | kure + imae | ele devia andar |
Resultivo | la + imae | ele anda (como esperado) |
Admirativo | nhy + imae | ele anda (inesperadamente) |
O perfeito é formado por uma junção do perfectivo e imperfectivo. O sugestivo é formado pelo imperfeito com o particípio.
É muito comum que tempos, aspectos e modos se misturem e mudem com o tempo, então tente combinar os que você tem para achar novas possibilidades.
Exemplos de frases:
y
DEF
kiliki
tatu
u=
IPFV=
imae
andar
mhi
em
Tyle,
Tyle,
ue
agora
ly
ele
imae
andar
mhi
em
Palima
Palima
"O tatu andava em Tyle, mas agora ele anda em Palima"
kiliki-ta
tatu-TOP
y
DEF
tao
perna
da=
PFV=
sunha,
quebrar,
la=
INDIR=
pulu
não
lyta
ele
imae
andar
"O tatu quebrou a perna, logo ele não pode mais andar"
kiliki
tatu
da=
PFV
putai
cair
sy
de
tumha,
morro,
ly
ele
nhy=
ADM
u=
IPFV
imae
andar
=e
PTCP
"O tatu caiu do morro, pórem ele ainda pode andar"
kiliki
tatu
da=
PFV
u=
IPFV
alau
sofrer
sola
(intensivo)
:(
:(
"O tatu tem sofrido muito :("